POSIÇÕES OFICIAIS

 

Posição sobre a prescrição por denominação comum internacional (DCI)

 

Os fármacos AE são considerados medicamentos de dose crítica (ou de índice terapêutico estreito) obrigando a uma monitorização apertada da sua eficácia versus tolerabilidade.
Assim, a LPCE estabeleceu um conjunto de recomendações sobre a utilização de medicamentos AE genéricos (ver abaixo).
A possibilidade de substituição na farmácia entre diferentes fármacos AE genéricos seria assim contrária às recomendações da LPCE sobre este assunto. Adicionalmente, seria também potenciadora para outras situações, também elas geradoras de erros, como por exemplo, diferentes embalagens (perdendo o doente a familiaridade com o fármaco, o que poderia ocasionar realmente erros nas tomas) ou, ainda, as frequentes rupturas de stock.
Deste modo é intenção da LPCE alertar todos os intervenientes envolvidos neste processo para o seguinte:

1. Os doentes com Epilepsia e que estão controlados com fármacos AE foram progressivamente aligeirando um conjunto de condutas de segurança à medida que foram sentindo maior confiança com a inexistência de crises epilépticas. Do ponto de vista da nossa legislação, inclusivamente, os doentes sem crises há mais de dois anos podem obter a carta de condução de ligeiros.
2. Neste sentido é muito significativo para os doentes com Epilepsia controlados a recorrência de uma nova crise epiléptica, pelas consequências reais que daí podem advir, nomeadamente quanto aos acidentes – de trabalho, rodoviários, ou de lazer (piscina, por exemplo) – à interdição de novo da condução ou ainda na esfera da sua auto-estima e insegurança.
3. Neste contexto julgamos também que não seria fácil a responsabilização civil ou criminal por tais ocorrências, dada a dificuldade em concretizar ou determinar essa responsabilidade.

A aprovação do diploma do Governo na Assembleia da República sobre prescrição por DCI, ao estabelecer a obrigatoriedade da prescrição por DCI, foi sensível ao considerar como critérios de exclusão dessa mesma obrigatoriedade, a utilização de fármacos com índice terapêutico estreito, ou a necessidade de assegurar um tratamento prolongado em patologias crónicas, ficando assim a Epilepsia incluída nessa não obrigatoriedade de prescrição por DCI. Competirá ao médico prescritor justificar tecnicamente a razão pela qual impede a substituição do medicamento prescrito.
A LPCE alerta assim todos os intervenientes neste processo – médicos prescritores (especialistas e médicos de família), farmacêuticos e aos próprios doentes e seus familiares – para uma apertada monitorização destas terapêuticas, tentando minimizar eventuais desvios nestas orientações com as suas potenciais consequências.
Recomendamos também que sejam prestadas todas as informações às autoridades competentes (Infarmed) decorrentes desta maior vigilância, para que possam vir a ser desencadeados comportamentos reguladores se necessários.

Coimbra, 14 de Novembro de 2011
A Direcção Nacional da LPCE

 

 

CRITÉRIOS PARA ISENÇÃO DE TAXAS MODERADORAS

No seguimento das dúvidas e interrogações que nos têm sido colocadas por médicos e pessoas com epilepsia relativamente à possibilidade de isenção do pagamento das taxas moderadoras no que toca às pessoas com epilepsia, a Direcção da LPCE considera pertinente esclarecer o seguinte:

O regime das taxas moderadoras no acesso à prestação de cuidados de saúde no âmbito do Sistema Nacional de Saúde encontra- se estabelecido no Decreto-Lei no 173/2003, de 1 de Agosto, tendo sido objecto de alteração e republicação no Decreto-Lei no 79/2008, de 8 de Maio. No art. 2o, alínea r) do Decreto-Lei no 173/2003, de 1 de Agosto, isenta-se o pagamento das taxas moderadoras aos “…doentes portadores de doenças crónicas, identificadas em portaria do Ministro da Saúde que, por critério médico, obriguem a consultas, exames e tratamentos frequentes e sejam potencial causa de invalidez precoce ou de significativa redução de esperança de vida.”.

Sucede que, a epilepsia, apesar de ser uma doença crónica, não está identificada na portaria a que se refere o diploma, que se encontra aliás desactualizada e mereceria actualização. Contudo, é esta a base legal que tem sido utilizada pela maioria dos médicos. No que concerne ao critério médico, entende a Direcção da LPCE que existem diversas formas de Epilepsias, variando em múltiplos aspectos, entre os quais em gravidade e consequente repercussão em termos individuais e sociais.

 

A isenção de taxas moderadoras na Epilepsia faz sentido ser aplicada naqueles doentes que necessitam de um acompanhamento médico mais intenso, com consultas médicas regulares, admissões hospitalares ordinárias e realização de exames complementares e, ainda, com frequentes admissões hospitalares urgentes em resultado de crises epilépticas, admissões essas ocorrendo muitas vezes de forma involuntária. Estas formas de epilepsia estão associadas com um significativo aumento da morbilidade e da mortalidade (1).
Assim, é nosso entendimento que a isenção do pagamento das taxas moderadoras deve abranger os doentes que apresentam formas de “Epilepsia refractária”, tal qual foi estipulado pela Comissão de Terapêutica da Liga Internacional Contra a Epilepsia em 2009, referindo-se à “Epilepsia refractária” como uma falência da terapêutica médica em se conseguir uma situação sustentada sem ocorrência de crises epilépticas. Para efeitos desta posição, considera-se falência da terapêutica médica quando forem tentadas, sem sucesso, pelo menos duas terapêuticas instituídas, que tenham sido adequadas, toleradas e usadas, quer em monoterapia, quer em combinação(2).

Coimbra, 29 de Abril de 2011

A Direccão Nacional da LPCE

 

Referências:

(1) http://www.ilae- epilepsy.org/Vistors/Documents/EUROReport160510.pdf
(2) Epilepsia, 51(6):1069-1077, 2010

 

utilização de medicamentos antiepilépticos genéricos

Introdução:

                 

Um medicamento genérico é um medicamento com a mesma substância activa, forma farmacêutica e dosagem, e com a mesma indicação terapêutica que o medicamento original, de marca, que lhe serviu de referência (www.infarmed.pt/genericos). São medicamentos cujas substâncias activas se encontram no mercado há vários anos e que, por essa razão, apresentam maior garantia de efectividade e permitem um melhor conhecimento do respectivo perfil de segurança. Apresentam a mesma segurança e eficácia do medicamento de referência, traduzidas na demonstração de bioequivalência por estudos de biodisponibilidade (Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto). Para determinar a bioequivalência, são usados dois parâmetros farmacocinéticos, a área sob a curva concentração-tempo (AUC) e a concentração plasmática máxima (Cmax). Considera-se que está demonstrada a bioequivalência quando o intervalo de confiança a 90%, da razão entre o genérico e composto de referência, para a AUC e para a Cmax estão dentro de um intervalo 80 a 125% (Guideline for the investigation of bioequivalence). Para além disso, os medicamentos genéricos são 20 ou 35% mais baratos do que o medicamento de referência, o que é uma enorme vantagem, quer para os utentes, quer para o SNS ao permitir uma melhor gestão dos recursos disponíveis (www.infarmed.pt/genericos).

 

Existem actualmente muitos fármacos antiepilépticos genéricos (AEgen) cuja bioequivalência aos medicamentos de referência (AEref), foi demonstrada. Este facto, sendo de enorme importância no tratamento de doentes com epilepsia, permite simultaneamente o controlo dos custos com a saúde. Contudo, algumas particularidades dos AEgen têm gerado receios na sua utilização, por parte de médicos e doentes. Muitas das dúvidas advêm do facto dos medicamentos antiepilépticos, enquanto classe, serem considerados medicamentos de dose critica (ou de índice terapêutico estreito), obrigando a uma monitorização apertada dos níveis séricos e/ou da dose terapêutica (Levy G, 1998). Neste tipo de medicamentos, a concentração tóxica mínima no sangue aproxima-se frequentemente da concentração eficaz mínima, podendo surgir a dúvida se a pequena variabilidade entre produtos, permitida pelos critérios actuais de bioequivalência, poderá ter relevância clínica (Sampaio C, 2009). É de facto plausível, que uma redução modesta nos níveis plasmáticos possa ser suficiente para causar recorrência das crises em doentes que estejam bem controlados (Perucca et al, 2006).

 

Assim, a Liga Portuguesa Contra a Epilepsia (LPCE), de forma semelhante a outras congéneres internacionais, decide emitir o seu parecer sobre este assunto, respondendo às preocupações seguintes:

a. São os fármacos AEgen iguais aos AEref em termos de eficácia, segurança e qualidade?     
Os estudos de biodisponibilidade, permitem afirmar que AEgen existentes no mercado Português são equivalentes aos AEref em termos de eficácia, segurança e qualidade.

b. Podem os AEgen ser prescritos num doente que vai iniciar o tratamento farmacológico antiepiléptico?
Os AEgen podem ser prescritos em doentes que vão ser expostos ao princípio activo pela primeira vez (monoterapia inicial, monoterapia alternativa ou terapêutica adjuvante) ou após um longo intervalo, dado a evidência de permutabilidade que orienta a produção de genéricos (Sampaio C, 2009).

Visto que, no inicio do tratamento, o médico estabelece sempre um plano de titulação da dose para o efeito desejado ou de acordo com a tolerabilidade, que pode incluir a determinação dos níveis séricos, é indiferente a utilização de um genérico ou do medicamento original (Sampaio C, 2009).

Aquando da prescrição inicial de um antiepiléptico, os doentes devem ser sempre informados da disponibilidade de AE gen, dos critérios que regulam a sua aprovação e das particularidades do seu uso. Isto é importante para melhorar a adesão terapêutica e diminuir a ansiedade associada por vezes ao uso de genéricos (Perucca et al, 2006). Contudo, a opinião do doente deve ser tida em conta (Overgaard et al, 2001; Perucca et al, 2006). De facto, no inicio do tratamento antiepiléptico,a única razão para optar por um AEgen ou por um AEref (não considerando a questão do preço), é a eventual expressão de preferência por parte do doente (Sampaio C, 2009). Na prática clínica, há por vezes doentes que expressam preferências baseadas por exemplo na cor dos comprimidos, na sua forma ou tamanho (Overgaard et al, 2001).

c. Podem os AEref ser substituídos por AEgen, num doente já medicado?
A análise sistemática da literatura efectuada por Perucca e colaboradores, não encontrou ensaios de qualidade suficiente, analisando o risco/benefício da substituição de AEref por AEgen. Embora existam relatos de perda ou agravamento do controlo das crises e mesmo de aparecimento de eventos adversos após a substituição de um AEref por um AEgen (Besag, 2000; Crawford et al, 2006), a análise crítica da evidência existente não permitiu estabelecer com segurança uma associação entre essa substituição e as alterações clínicas reportadas. De facto, a substituição de um AEref por um AEgen, é em geral bem tolerada pela maioria dos doentes e custo-efectiva (Bialer, 2007). Se o doente está a medicado com um AEref e tem um controlo incompleto das crises, pode ser racional, após discussão com o doente, a sua substituição por um AEgen. Durante essa substituição, a monitorização dos níveis plasmáticos, se possível, pode ser útil (Perucca et al, 2006).

 

Outros casos especiais:

– É plausível que uma pequena redução dos níveis plasmáticos associada à substituição de um AEref por um AEgen possa ser suficiente para causar uma recorrência de crises, com consequências inevitáveis a nível pessoal, profissional e social, em doentes que estão bem controlados. Desta forma, enquanto não existirem ferramentas de avaliação da bioequivalência individual (em cada doente) e de identificar previamente os doentes que manterão o controlo das crises após a substituição de um AEref por um AEgen, não é recomendável esta substituição em doentes que estejam sem crises (Perucca et al, 2006; Bialer 2007).

– Um antiepiléptico de libertação prolongada não deve ser substituído por um antiepiléptico de libertação imediata genérico, visto não estar assegurada neste caso a bioequivalência (Perucca et al, 2006).

– É frequente que os médicos subestimem a frequência com que os genéricos são substituídos na farmácia (Guberman e Corman, 2000; Wilner, 2004). Consequentemente muitos recomendam que os médicos sejam mais vigilantes na sua forma de prescrição, de forma a prevenir uma substituição não segura (Wilner, 2004).

4. Podem os AEgen de diferentes casas comerciais ser substituídos entre si?
Uma pequena redução dos níveis plasmáticos pode ocorrer com a substituição de um AEgen por outro. Enquanto não existirem dados sobre a bioequivalência dos diferentes genéricos entre si, e de sobre o custo-efectividade de tal substituição, este procedimento deve ser evitado (Perucca et al, 2006). Assim, é desejável que a receita contenha o nome do produtor do genérico prescrito e a referência a que o AEgen não pode ser substituído. Se a substituição for necessária, a monitorização dos níveis plasmáticos, se possível, pode ser útil (Perucca et al, 2006).


Recomendações:

  1. Os fármacos antiepilépticos genéricos podem ser prescritos em doentes que vão ser expostos ao princípio activo pela primeira vez (monoterapia inicial, monoterapia alternativa ou terapêutica adjuvante) ou após um longo intervalo.
  2. Aquando da prescrição inicial de um antiepiléptico, os doentes devem ser informados da disponibilidade de fármacos antiepilépticos genéricos, dos critérios que regulam a sua aprovação e das particularidades do seu uso. Contudo, a opinião do doente deve ser tida em conta.
  3. Num doente não controlado, a substituição de um fármaco antiepiléptico de referência  por um genérico deve ser discutida com o doente e monitorizada (clinicamente e por níveis séricos, se possível)
  4. Não é recomendada a substituição de um fármaco antiepiléptico de referência por um genérico num doente bem controlado.
  5. Não é recomendado que os fármacos antiepilépticos genéricos sejam substituídos entre si.
  6. Uma receita de um AE genérico deve conter a referência ao nome do produtor e à não autorização de substituição.

 

Coimbra, 9 de Setembro de 2011

A Direcção Nacional da LPCE

 


 

Referências:

 

· Besag FMC. Is generic prescribing acceptable in epilepsy? Drug Safety 2000; 23:173–182.
· Bialer M. Generic Products of Antiepileptic Drugs (AEDs): Is It an Issue? Epilepsia 2007; 48(10): 1825–1832
· Crawford P, Feely M, Guberman A, Kramer G. Are there potential problems with generic substitution of antiepileptic drugs? A review of issues. Seizure 2006; 15:165–176.
·Estatuto do medicamento. Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto.
· Guideline on the investigation of bioequivalence. CHMP/EWP/QWP/1401/98 Rev. 1, draft released July 2008
· Guberman A, Corman C. Generic substitution for brand name antiepileptic drugs: a survey. The Canadian Journal of Neurological Sciences 2000; 27:37–43.
·  Levy G. What are narrow therapeutic index drugs? Clinical Pharmacology & Therapeutics 1998; 63: 501–505
· Overgaard AB, Højsted J, Hansen R, Møller-Sonnergaard J, Christrup LL Patients’ evaluation of shape, size and colour of solid dosage forms. Pharm World Sci. 2001 Oct;23(5):185-8.
· Perucca E, Albani F, Capovilla G, Bernardina BD, Michelucci R, Zaccara G. Recommendations of the Italian League against Epilepsy working group on generic products of antiepileptic drugs. Epilepsia 2006;47 Suppl 5:16-20.
· Sampaio C. Genéricos: Trocas e Baldrocas. Questões relacionadas com a permutabilidade e substituibilidade de medicamentos de dose crítica (Índice terapêutica estreito). Infarmed 2009;9.
·Wilner AN. Therapeutic equivalency of generic antiepileptic drugs: results of a survey. Epilepsy & Behavior 2004;5:995–998.
· www.infarmed.pt/genericos